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Do acesso ao título da primeira divisão: a façanha do Kaiserslautern no final dos anos 90

Imago

A década de 90 tem um lugar especial no coração do torcedor do Kaiserslautern. O melhor momento da história do clube foi vívido durante o período: o Kaisers conquistou tudo que lhe era possível, de Bundesliga a DFB-Pokal até a Supercopa. O campeonato alemão, os Diabos Vermelhos conquistaram duas vezes, a primeira em 1991 e a segunda em 1998, esta que, dado o contexto, foi um milagre: veio após acesso da segundona alemã — feito jamais alcançado por outra equipe do país.

O rebaixamento aconteceu na temporada 1995/96 e foi o primeiro do Kaiserslautern na Era Bundesliga. Mesmo com perdas significativas — quatro jogadores titulares deixaram o grupo na janela de verão de 1995 — , o elenco era bom o suficiente para se manter na primeira divisão. A principal baixa foi Ciriaco Sforza, que se transferiu para o Bayern por 3,3 milhões de euros.

Onze novos jogadores foram contratados ao decorrer das janelas de transferências. A principal aquisição foi o meia-campista Arilson, na janela de janeiro de 1996, junto ao Grêmio, por 3 milhões de euros — ainda que seja um valor muito baixo, na época foi o maior investimento já feito pelo Kaiserslautern e até hoje figura o top10. O brasileiro tinha como missão suprir a falta que Sforza fazia no meio-campo da equipe, mas não correspondeu à altura, disputou 10 jogos na segunda metade da temporada e somou mais cartões amarelos (2) e problemas extra-campo do que participações em gol.

Arilson teve problemas de relacionamento com Andreas Brehme, capitão do time na época. Por conta disso deixou o clube ao final da temporada, retornando ao Brasil para defender o Internacional, mesmo sendo assumidamente gremista. O rigoroso inverno alemão também foi um empecilho para o jogador.

O início de temporada veio acompanhado de um calendário complicadíssimo. Na primeira rodada já tiveram de ir à Dortmund para enfrentar o Borussia, e dada as circunstâncias, o resultado obtido foi bom: 1 a 1. Na sequência, tiveram Borussia Mönchengladbach [C], Sankt Pauli [F], Stuttgart [C], Eintracht Frankfurt [F] e Bayern [C] — 5 pontos foram conquistados nesses seis primeiros jogos. Inicio não tão bom, mas longe de ser desastroso.

O Kaiserslautern veio a ocupar a zona de rebaixamento pela primeira vez já na segunda rodada, mas foi na oitava que começou a dar indícios, de fato, de que a temporada poderia ser um desastre. Em casa, apenas um empate burocrático com o Colônia por 1–1 em jogo que tinha cenário favorável para iniciar uma retomada dentro do campeonato — àquela altura, os Bodes estavam apenas uma posição à frente dos Diabos Vermelhos. Ao fim do primeiro turno, ocupava a décima quarta colocação com 17 pontos — apenas um à frente da zona de rebaixamento.

No segundo turno, a equipe sofreu do mesmo problema da primeira metade da temporada: a seca de gols, apesar de uma pequena melhora após troca no comando técnico na 25.ª rodada — Friedel Rausch por Eckhard Krautzun. Sob o comando de Krautzun, a equipe marcou teve média de 1 gol por jogo, com Rausch era de 0,86.

A queda foi decretada na 34.ª rodada, em Leverkusen. O Kaiserslautern tinha que vencer a partida para se manter na elite, só que o Bayer também estava ameaçado de rebaixamento e não podia perder, o que resultou em um dramático empate por 1 a 1, com gol salvador (para os Aspirinas) de Markus Münch — que ainda não havia marcado na temporada — aos 82 minutos.

Os Diabos Vermelhos tiveram a terceira melhor defesa do campeonato, mesmo rebaixados, e o segundo pior ataque, com 37 gols sofridos e 31 marcados. Eintracht Frankfurt e Uerdingen foram as demais equipes que caíram. A campanha: 34 jogos; 6 vitórias; 18 empates; 10 derrotas.


O "desafogo" veio uma semana após o descenso, com a vitória da Copa da Alemanha em Berlim. Ao menos um motivo para sorrir, os torcedores Roten-Weiss tiveram.

A conquista da DFB-Pokal

O caminho até a capital não foi fácil. Já na primeira fase, o Kaiserslautern teve que encarar uma prorrogação diante o Viktoria Köln, e por muito pouco o confronto não foi para as penalidades - aos 118 minutos, o meia-campista Dirk Flock garantiu a classificação do clube. Antes de chegar à decisão, o FCK ainda disputou outra prorrogação, nas quartas de final, contra o FC 08 Homburg, o cenário foi semelhante ao visto no embate com o Viktoria: vaga para fase posterior garantida apenas nos minutos finais do tempo extra.

Na final, tiveram o Karlsruher pela frente e venceram por 1 a 0. Martin Wagner foi o responsável por dar alegria ao seu povo, em cobrança de falta aos 41 minutos da primeira etapa.

À direita, o capitão Andreas Brehme com o troféu

Retorno para primeira divisão

Para disputa da 2. Bundesliga, o Kaiserslautern fez reformulações nos departamentos técnico e diretivo, além de mudanças no elenco, é claro. Otto Rehhagel foi quem assumiu a equipe no lugar Krautzun. Multicampeão pelo Werder Bremen, velho conhecido da casa (foi jogador do clube durante sete anos) e em baixa após trabalho aquém do esperado no Bayern, Rehhagel era a peça perfeita para as pretensões dos Roten Teufel.

Alguns jogadores importantes saíram após a queda, mas a maioria permaneceu, o que foi primordial para o acesso. Oito reforços foram contratados, entre eles um brasileiro muito pouco conhecido, Ratinho (Everson Rodrigues), formado pelo Matsubara e com passagem pelo Athletico Paranaense.

O Kaiserslautern estreou na competição sem vitória, ficando apenas em um empate por 0 a 0 com o Unterhaching. O caminho da felicidade foi descoberto na segunda rodada, na qual bateram o Stuttgarter Kickers por 2 a 0, fora de casa. Dai em diante foram mais 8 triunfos no primeiro turno, terminando o mesmo na primeira colocação com 33 pontos. No segundo turno, tudo correu perfeitamente. O ataque foi mais letal e a defesa foi tão segura quanto fora na Hinrunde.

O acesso foi confirmado na 30.ª rodada, enquanto o título foi celebrado três rodadas depois. O vice-campeonato ficou por conta do Wolfsburg, que terminou com 58 pontos, 10 a menos que os Diabos Vermelhos. A última vaga para a elite ficou com o Hertha Berlin. O Kaiserslautern se despediu da competição protagonizando um jogo maluco com o Meppen, no Fritz-Walter-Stadion, que terminou em vitória por 7 a 6.

Temp. 1997/98: o quarto titulo alemão 

De volta à primeira divisão, os Diabos Vermelhos não eram um dos favoritos ao título — estes eram Bayern e Borussia Dortmund, além de Bayer Leverkusen, Schalke 04 e VfB Stuttgart correndo por fora — mas também não eram candidatos ao rebaixamento.

Incapaz de realizar grandes contratações devido ao pequeno poderio financeiro, o Kaiserslautern realizou apenas negócios de baixo custo e pontuais. Ciriaco Sforza, Andreas Buck, Marian Hristov, Michael Ballack, Stefan Ertl, János Hrutka, Lajos Szűcs e Petr Kouba foram os contratados — o último deixou o clube na janela seguinte.

Sforza, que foi a principal aquisição, estava de volta ao clube após dois anos que tinha o deixado para rumar ao Bayern e posteriormente para Internazionale. A contratação de Michael Ballack, de apenas 20 anos, foi a pedido do treinador Otto Rehhagel. O Little Kaiser- apelido que recebeu quando foi promovido a equipe profissional do Chemnitzer FC — chamou atenção de Otto por conta da boa temporada que fez na terceira divisão — 10 gols e 5 assistências em 34 jogos disputados.

O Kaiserslautern estreou na competição frente ao Bayern, fora de casa. A expectativa para partida era alta e 63 mil pessoas foram ao estádio prestigiar o confronto. O Bayern — que contava com Lothar Matthäus, Giovane Élber e Oliver Kahn — era favorito. Entretanto, não conseguiu se provar e viu, aos 80 minutos, Michael Schjønberg anotar o gol que daria a vitória aos visitantes minutos depois. Nas três rodadas seguintes, os adversários foram Hertha Berlin [C], Colônia [F] e Schalke 04 [C]; sete pontos foram conquistados nesses jogos — empate com os Bodes e triunfos contra os outros dois rivais. A vitória sobre os azuis-reais (3 a 0), foi determinante para competição: por meio dela, os Roten Teufel assumiram a liderança do campeonato e não a deixaram mais até o final da temporada.

Os Diabos Vermelhos somavam 39 pontos ao fim do primeiro turno. Quatro a mais que o vice-líder, Bayern, e 10 a mais que o terceiro colocado, Stuttgart. O Borussia Dortmund, que era um dos favoritos a conquista da competição, tinha apenas 3 pontos a mais que o primeiro time da zona de rebaixamento, assim estando fora da luta pelo título.

Marian Hristov, Olaf Marschall, Michael Schjønberg e Pavel Kuka comemorando o gol contra o Bayern na primeira rodada (Getty)

Com o início do segundo turno, veio o reencontro com o Bayern, que teve quase de tudo: estádio lotado, gol contra/impedido/nos minutos finais, jogador reclamando com arbitragem por pênalti não marcado, sinalizador sendo atirado no gramado… e nova vitória do Kaiserslautern, esta por 2 a 0, com gols de Dietmar Hamann (contra) e Marian Hristov.

Oscilações em momentos cruciais aconteceram e os pontos ganhos contra o Rekordmeister, além de tropeços inacreditáveis do próprio — entre eles uma derrota por 2 a 0 para o Colônia (que foi rebaixado) — foram essenciais para conquista dos Diabos Vermelhos.

A confirmação do título veio na penúltima rodada. Para consagrar-se, o Kaiserslautern precisava de uma simples vitória frente ao Wolfsburg e que o Bayern tropeçasse diante o Duisburg. Foi o que aconteceu, apesar de inesperado — caso o Bayern tivesse vencido seu jogo, a decisão do título teria ficado para última rodada, quando jogaria o Klassiker com o Borussia Dortmund, em Munique, e o Kaiserslautern visitaria o Hamburgo.

O Kaiserslautern goleou os Lobos por 4 a 0, com gols de Marschall (2), Wagner e Jürgen Rische. Já em Duisburg, os bávaros ficaram apenas no 0 a 0 com os donos da casa.

19 vitórias, 11 empates e 4 derrotas resultaram em 69 pontos. No que diz respeito a gols, terceiro melhor ataque e segunda melhor defesa, com 63 tentos marcados e 39 sofridos. Campanha irredutível e milagrosa que rendeu a quarta Meisterschale aos Diabos Vermelhos.

Olaf Marschall foi vice-artilheiro da competição com 21 gols em 24 jogos — o artilheiro foi Ulf Kirsten, do Bayer Leverkusen, com 22 tentos. Martin Wagner, peça importante na conquista, hoje faz parte do conselho de disciplina do clube.

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