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Entrevista exclusiva: Carlos Eduardo, o brasileiro ex-camisa 10 do TSG Hoffenheim

Com passagem de sucesso e reconhecimento no futebol alemão, ex-meio-campista Carlos Eduardo fala exclusivamente com o Fussball Brasil sobre seu legado no TSG Hoffenheim

(Alexander Hassenstein/Bongarts/Getty Images)

O Fussball Brasil traz para os fãs da Bundesliga mais uma entrevista exclusiva com um jogador brasileiro que teve passagem pelo futebol alemão. Dessa vez, o toque de mágica fica por conta do ex-camisa 10 do TSG Hoffenheim, Carlos Eduardo Marques Carlini, para os mais íntimos “Cadu”, que teve uma notável trajetória no clube da cidade de Sinsheim e foi o primeiro brasileiro a vestir a camisa do Hoffe, que já contou com 17 atletas do país e atualmente possui dois no elenco: Arthur Chaves e Bernardo

A TRAJÉTORIA ATÉ O FUTEBOL ALEMÃO:

Natural de Ajuricaba, no Rio Grande do Sul, Carlos Eduardo chegou ao Grêmio aos 13 anos, passando por todas as etapas de formação até ser promovido ao time principal em janeiro de 2007. Chamou atenção logo nos primeiros meses, sendo campeão gaúcho e ganhando minutos no Brasileirão e na Libertadores. Seis meses depois de sua estreia profissional, foi transferido ao Hoffenheim numa transação de 7 milhões de euros. Ao todo, fez 38 jogos oficiais pelo Grêmio, com nove gols e duas assistências.

Chegando à Alemanha em julho de 2007, Cadu estreou em setembro pela equipe do então treinador austríaco Ralf Rangnick, que já o observava desde os jogos pelo Grêmio. O meia se encaixou bem no time que conquistou a inédita promoção à Bundesliga, terminando a 2. Bundesliga na vice-liderança com 60 pontos. Usando a camisa 33, marcou cinco gols e deu quatro assistências em 22 jogos, além de registrar um gol e uma assistência na DFB-Pokal, campanha que terminou nas quartas de final após derrota por 3 a 1 contra o Borussia Dortmund.

Carlos com os jogadores do Hoffenheim comemorando o acesso à Bundesliga (Christof Koepsel/Bongarts/Getty Images)

Dias depois da sua chegada, o clube também trouxe o volante Luiz Gustavo, que se tornou o segundo brasileiro da história do Hoffe. Aquele elenco reunia ainda nomes como Demba Ba, Sejad Salihović, Vedad Ibišević e Chinedu Obasi, que junto com Cadu formaram a base técnica da equipe que conquistou o acesso.

Na primeira temporada na elite, em 2008/09, Carlos Eduardo mostrou qualidade, mas enfrentou problemas disciplinares. O primeiro ocorreu em janeiro, durante um amistoso contra o Hamburgo, em que se desentendeu com Ivica Olić e acabou suspenso da 17ª até a 19ª rodada. Depois, em abril, foi expulso por uma cotovelada em Philipp Bönig, do VfL Bochum, ficando fora da 28ª até a 32ª rodada.

Quando retornou, respondeu em campo. Contra o Bayern de Munique, na penúltima rodada, marcou um gol e deu uma assistência no empate em 2 a 2. No encerramento da temporada, diante do Schalke 04, foi decisivo mais uma vez, marcando dois gols e servindo uma assistência na vitória por 3 a 2. O Hoffenheim terminou sua temporada de estreia na Bundesliga em 7º lugar, com 55 pontos. Carlos Eduardo fechou aquela edição da liga com oito gols e seis assistências, além de uma assistência nos dois jogos disputados na Copa da Alemanha 2008/09.

Na temporada 2009/10, Carlos Eduardo assumiu a camisa 10 e se firmou como um dos principais nomes técnicos do Hoffenheim. Disputou 33 jogos pela Bundesliga, marcou cinco gols e distribuiu nove assistências. Naquele período, outro brasileiro também integrava o elenco: Maicosuel. Apesar da boa regularidade do meia, a equipe oscilou coletivamente e terminou a competição na 11ª posição, com 42 pontos. A temporada 2010/11 marcou sua despedida. Cadu atuou apenas no primeiro compromisso oficial, a vitória por 4 a 0 sobre o Hansa Rostock pela DFB-Pokal, e pouco depois acertou sua transferência para o Rubin Kazan, da Rússia, por 14 milhões de euros. Sua passagem por Sinsheim terminou com 90 jogos oficiais, 19 gols e 22 assistências, números que o colocam como um dos grandes protagonistas da primeira era do Hoffenheim na Bundesliga.

CONFIRA AQUI A ENREVISTA COMPLETA:

1 - Fussball Brasil: Como foram os primeiros dias no TSG Hoffenheim, foi difícil se adaptar pela diferença cultural e linguística?

Carlos Eduardo - O Ralf Rangnick (técnico) me ajudou muito. Ele já tinha acompanhado alguns jogos meus no Brasil e sabia exatamente como eu jogava, por onde eu gostava de atuar. Os primeiros dias foram mais tranquilos, até porque cheguei no verão, durante a janela de transferências de verão. Mas eu sempre digo: se você tem um sonho e quer alguma coisa, precisa se adaptar o mais rápido possível — não importa se é frio ou calor. É preciso foco e trabalho. Eu venho de uma escola gaúcha, que é um pouco diferente das outras do Brasil. Lá (Rio Grande do Sul) também faz bastante frio, então me adaptei rápido. Logo depois chegou o Luiz Gustavo, que acabou se tornando um grande irmão pra mim — temos contato até hoje. Aos poucos, fomos aprendendo alemão, tanto no campo quanto nas aulas semanais. Se faltasse às aulas, tinha que pagar multa. É assim lá: falando e entendendo alemão, você trabalha melhor.

Ralf Rangnick apertando Carlos Eduardo carinhosamente 
(Alex Grimm/Bongarts/Getty Images)

2 - Fussball Brasil: Qual foi a diferença pra você do futebol alemão para o brasileiro?

Carlos Eduardo - É muito mais rápido e físico. Lembro que, no meu primeiro jogo, eu driblava um, driblava outro, e os caras me 'levantavam', e o juiz mandava seguir o jogo. Senti bastante essas diferenças. A régua técnica dos europeus, dos alemães, é muito alta. Eles trabalham muito o básico do futebol, o domínio, o passe, e isso é fundamental. Pude aprender muito com eles. O Hoffenheim e o futebol alemão foram uma escola que me fizeram crescer como jogador e como pessoa. Aprendi a me portar na vida, a ter disciplina, e isso a gente aprende lá tanto dentro das quatro linhas. quanto fora delas.

3 - Fussball Brasil: Como foi chegar na Seleção Brasileira jogando pelo TSG Hoffenheim?

Carlos Eduardo em jogo contra a Ucrânia pela Seleção (Bruno Domingos/MoWA Press)

Carlos Eduardo - Foi um sonho! Acho que todo jogador sonha em jogar na Europa e depois chegar à Seleção Brasileira. Fiquei muito feliz na época e sempre digo uma coisa: cheguei à Seleção com o Hoffenheim, um clube mais modesto em comparação aos grandes das ligas europeias, graças ao meu esforço e ao meu trabalho. O Ralf Rangnick tem uma grande parcela nisso, pelos ensinamentos dele. Ele pegava muito no meu pé, a gente batia de frente às vezes, mas ele sabia do meu potencial e me ajudou a chegar nesse nível. Tanto que a primeira camisa da Seleção eu dei pra ele. Quando cheguei lá, fiquei muito orgulhoso. Tinha cerca de 22 anos, e estar no meio de grandes craques, jogadores que eu acompanhava pela televisão, foi maravilhoso. Bati na porta da Copa do Mundo de 2010, fiquei de fora, na lista de suplentes, mas isso, pra mim, já é motivo de muito orgulho.

4 - Fussball Brasil: Não teve nenhuma frustração por não ir para a Copa do Mundo de 2010?

Carlos Eduardo - Não! Estamos falando de um país gigantesco, com muito talento. Eu estava ali disputando espaço com Kaká, Elano, Júlio Baptista, jogadores de alto nível que atuavam nos maiores clubes do mundo. Então não existe frustração, só orgulho. Venho de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, com apenas seis mil habitantes, e já foi um grande motivo de orgulho ter chegado à Seleção. Não tenho do que reclamar da minha carreira. Claro que poderia ter sido melhor, as lesões atrapalharam, mas conquistei tudo aquilo que almejei.

5 - Fussball Brasil: Também gaúcho e jogou no futebol alemão, como foi a sua relação com o técnico Dunga na Seleção? 

Carlos Eduardo - Ele foi o cara pra mim! Acreditou no meu futebol. É uma pessoa muito direta, e eu acho que na vida a gente tem que ser assim, porque isso ajuda em tudo. Ele é muito sério no trabalho, cobra bastante, e às vezes ficava um pouco nervoso, até com coisas externas, como torcedores e imprensa. Mas sempre quis o melhor para a Seleção e fez um bom trabalho. Infelizmente, a Seleção perdeu para os Países Baixos, com dois gols em momentos de falha que não deveriam acontecer. Acho que, se tivesse passado ali, iria levar a taça. Depois, quando eu estava voltando para o Brasil, ele trabalhava em um clube brasileiro, entrou em contato comigo e queria me contratar, antes mesmo de eu ir para o Flamengo. Então, é uma ótima relação e só tenho a agradecer a ele.

6 - Fussball Brasil: Você jogou com o brasileiro Maicosuel no Hoffenheim, como foi sua relação com ele?

Maicosuel e Carlos Eduardo treinando no TSG Hoffenheim (Photo by Alex Grimm/Bongarts/Getty Images)

Carlos Eduardo - Foi otíma! Ele é um grande jogador, ele chegou jogando muito bem. Lembro de um jogo contra o VfB Stuttgart, debaixo de muita neve, e ele tava jogando muito nesse jogo. Ai o Ralf Rangnick me tirou no intervalo, porque eu tava congelando. O Ralf disse pra mim: Carlos você já está aqui adaptado, o Maicosuel que acabou de chegar, se adaptou ao jogo e jogou muito. Teve uma adaptação muito boa, ele jogava muito. Agora virou cantor (risos). Temos uma relação muito boa, depois ainda a gente se encontrou para jogar juntos no Atlético-MG. Grande jogador, grande pessoa, grande amigo que o futebol me deu.

7 - Fussball Brasil: Como você se sente sendo o brasileiro pioneiro no TSG Hoffenheim e quais compatriotas você teve no clube?

Carlos Eduardo - Teve o atacante Wellington, o "Tanque", centroavante que joga já por muitos anos no Japão. Sou padrinho da filha dele. A história dos brasileiros no Hoffenheim é linda. Comigo, eles pagaram cerca de sete, oito milhões de euros e venderam por mais de 20 milhões. Luiz Gustavo, ele pagaram pouco e venderam bem mais caro ao FC Bayern. Depois teve o Roberto Firmino e Joelinton também pela mesma dinâmica. Eu fui o brasileiro a chegar no clube e chegar no projeto deles, lá dentro do clube na parte da fisioterapia tem uma bandeira do clube. 

Wellington e Carlos Eduardo na pré-temporada em La Manga, Espanha, 2009.
 (Photo by Jasper Juinen/Getty Images)

8 - Fussball Brasil: O que você acha do Arthur Chaves, zagueiro brasileiro que está atualmente no time?

Carlos Eduardo - A primeira vez que vi o Arthur Chaves foi através de uma noticia aqui no Brasil, na qual ele tinha atingido uma marca de alta velocidade em uma partida da Bundesliga. Recentemente, eu tive a oportunidade de encontrar com ele no Barra, clube de Santa Catarina, que tem relações com o Hoffenheim. O pessoal que me levou ao Hoffenheim, trabalha ali no clube. O Arthur é um menino super tranquilo, está com a cabeça muito boa, assumiu a titularidade, eu acho que a história do brasileiro tenha que continuar no clube e fico torcendo para que ele vá bem. 

9 - Fussball Brasil: Você esteve recentemente na Alemanha por convite do TSG Hoffenheim?

Carlos Eduardo - Sim, no ano passado (2024). O clube completou 125 anos de história e convidou alguns ex-jogadores. Foi muito legal. Eu não conquistei títulos, mas participei da campanha de acesso à Bundesliga, que ficou marcada. Todos os ex-jogadores também receberam uma camisa especial em comemoração a essa data importante para o clube.

Carlos Eduardo em evento do TSG Hoffenheim, em Sinsheim (Foto de Arquivo Pessoal - IG)

10 - Fusssball Brasil: Você sentiu uma certa resistência de torcedores de outros clubes contra o TSG Hoffenheim, pela questão Dietmar Hopp, SAP?

Carlos Eduardo - Sim, eu já notei isso, faixas contra o Dietmar Hopp. Quando eu cheguei em 2007, foi uma transação histórica para um clube da segunda divisão. Ali mesmo na 2. Bundesliga eu lembro de repressão. Havia até uma música que cantavam "Scheißmillionäre", as torcidas pegavam muito no pé. Mas acho que agora já deu uma estabilizada, estão respeitando mais. E acho que o Dietmar Hopp trabalhou muito bem por lá. Ele aparecia muito pouco entre as jogadores. Eu tive a oportunidade de vê-lo no ano passado, já está bem velhinho. 

11 - Fussball Brasil: Quem foi o seu parceiro mais resenha por lá?


Carlos Eduardo - Eu sempre fui muito tranquilo, sem problemas com ninguém. Gostava bastante do Demba Ba, atacante senegalês, e também do Salihović e do Ibišević, dois bósnios. Conversava mais com eles — os bósnios e os africanos são bem parecidos com os brasileiros. Mas o cara com quem eu mais andava era o Luiz Gustavo. Moramos juntos por meio ano em uma casa. Ele é um grande irmão e trabalhou muito lá para chegar ao mais alto nível.

Carlos Eduardo ao lado de Salihović, Ibišević e Ralf Rangnick 
(Photo by Krafft Angerer/Bongarts/Getty Images)

12 - Fussball Brasil: Você chegou a jogar com o Roberto Firmino?


Carlos Eduardo - Não. Na verdade, ele foi a aposta do Hoffenheim quando eu deixei o clube. Como um substituto. 

Carlos Eduardo e Luiz Gustavo na pré-temporada de 2009, em La Manga. 
(Photo by Jasper Juinen/Getty Images)

13 - Fussball Brasil: Qual estádio/torcida você achou mais fantástico lá na Alemanha?


Carlos Eduardo - O Borussia Dortmund. A Muralha Amarela é sensacional, sempre lotado. Eu gostava de jogar em Dortmund, e também em Frakfurt. A torcida do Eintracht Frankfurt também é bem forte.

Carlos Eduardo em partida contra o Borussia Dortmund
 (Photo by Alex Grimm/Bongarts/Getty Images)

14 - Fussball Brasil: Qual foi o zagueiro mais difícil de enfrentar na Alemanha?

Carlos Eduardo - Foi o Lúcio. Pra mim, foi um dos melhores zagueiros do mundo. Muita força, muito imposição física. Um que não era zagueiro, mas também marcava muito era o Mark van Bommel, do Bayern de Munique.

15 - Fussball Brasil: Você acha que o FC Bayern tem algum privilégio na Alemanha?

Carlos Eduardo na disputa com Zé Roberto (Stuart Franklin/Bongarts/Getty Images)

Carlos Eduardo - O FC Bayern de Munique é um dos quatro maiores clubes da história. É um público mais elitizado. Todo jogador quer jogar lá. Eu acho que existe um pouco de favoritismo, pelo lugar, no sul da Alemanha, pelo investimento. Quem investe mais, sempre vai bater mais lá em cima. Então com base nisso, nos investimentos, é muito difícil tirar o título do FC Bayern.  

16 - Fussball Brasil: Como foi sua saída da Alemanha para a Rússia?

Carlos Eduardo - Eu acho que deveria ter ficado mais tempo na Alemanha. Até porque eu já era um ídolo do clube, mas aconteceram algumas coisas que não eram pra ter acontecido na época. Eu era um pouco mais "estressadinho", não aceitava algumas coisas, que hoje eu vejo diferente, que a gente aprende. Mas tudo foi como foi, não me arrependo de nada.

17 - Fussball Brasil: Como foi chegar em um clube como o Flamengo?

Carlos Eduardo - Eu tive uma parada antes de chegar ao Flamengo — fiquei um ano e meio afastado por causa de uma lesão no joelho, resultante de uma cirurgia e de um tratamento aqui no Brasil. Mas, fisicamente e tecnicamente, eu não estava 100%, mesmo estando apto. Eu deveria estar melhor; pensava que estaria melhor. Sei que o Flamengo tem a maior torcida do Brasil, e ela pegou um pouco no meu pé, até pelo investimento. Perdi um pouco de confiança, mas continuei lutando. Joguei com todos os treinadores que passaram por lá. E teve um gol importante contra o Cruzeiro, na ida da semifinal da Copa do Brasil: estávamos perdendo por 2 a 0, e eu diminuí o placar — o Flamengo acabou se classificando para a final na volta e sendo campeão. Saí de lá com três títulos: Taça Guanabara, Carioca e Copa do Brasil. Gosto demais desse clube; depois do Grêmio, é o clube para o qual eu torço aqui no Brasil.

18 - Fussball Brasil: Como você vê o nivelamento atual da seleção brasileira para seleção alemã?

Carlos Eduardo A Seleção Alemã se planeja, faz projeto. Talvez não esteja com a cabeça para ganhar agora, mas sim pensando lá na frente, preparando os meninos para a próxima Copa. O Wirtz é um grande jogador que surgiu, e também desejo uma rápida recuperação ao Musiala. Acho que o Brasil está em transição e tem tudo para dar certo. Há jogadores de alto nível que precisam jogar bem na Seleção, porque vão muito bem nos clubes, mas não pela Seleção. Já o Ancelotti, acredito que fará um grande trabalho — uma pena que tenha demorado tanto para realizar essa troca. Espero que dê certo.

FIM DE ENTREVISTA:

Essa foi a entrevista do Fussball Brasil com o histórico camisa 10 do TSG Hoffenheim. Agradecemos pela disponibilidade de Carlos Eduardo em realizar esse bate-papo conosco, contando bastidores de sua passagem no futebol alemão. Quer acompanhar ele de perto? Siga o Cadu no Instagram: @oficialcadu87. E claro, quer ficar por dentro de tudo do futebol alemão? Mantenham-se atentos em nosso site, também nas redes sociais: @FussballBR no X/Twitter e @FussballBrasil_ no Instagram.

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