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Análise tática: Tom Bischof

Entenda como atua a nova joia da Alemanha

As inconsistências nas atuações do TSG Hoffenheim, recorrentes desde a temporada passada (apesar da boa colocação do clube na Bundesliga), finalmente cobraram seu preço: o início da época 2024/25 do clube está bem abaixo das expectativas, algo que levou a direção do clube a optar pela demissão do treinador Pellegrino Matarazzo, substituído por Christian Ilzer. Atualmente na décima quinta posição da Bundesliga e realizando uma campanha apenas mediana na UEFA Europa League, é natural que poucos jogadores estejam se destacando nesta reta inicial de temporada. Ainda assim, o torcedor do TSG Hoffenheim tem pelo menos um motivo para se animar: a afirmação do jovem Tom Bischof (19) no time titular.

Tom Bischof — Foto: Daniel Kopatsch/Getty Images

Histórico

A qualidade de Tom Bischof não chega a ser novidade para aqueles que acompanham o futebol de base alemão. O meio-campista esteve sempre dentre os nomes mais badalados da base do TSG Hoffenheim (Tim Drexler e Umut Tohumcu são dois companheiros de geração que também tem aparecido no profissional hoje) e despertou muito interesse por suas exibições também nas Seleçôes Alemã Sub-17 e Sub-19 (por lá, atuou ao lado de nomes como Laurin Ulrich, Paul Wanner e Nelson Weiper, outras promessas do futebol local).

Paul Wanner (7) e Tom Bischof (10) comemoram gol durante a classificação para a Euro Sub-17 de 2022 — Foto: Ian MacNicol/Getty Images

O hype em torno de Bischof cresceu ainda mais quando ele fez sua estreia como profissional aos 16 anos e oito meses de idade, sob o comando do então treinador Sebastian Hoeness, em março de 2022 - foram 13 minutos em campo na derrota por 3-0 para o Hertha Berlin. Bischof tornou-se nessa ocasião o jogador mais jovem da história a disputar uma partida de Bundesliga pelo TSG Hoffenheim - considerando outros clubes, apenas Youssoufa Moukoko (Borussia Dortmund) e Paul Wanner (FC Bayern) superam essa marca. Na mira de clubes maiores da Europa, o jovem acabou renovando seu contrato com o TSG Hoffenheim, em vínculo válido até 2025 (final da temporada atual!). A partir daí, no entanto, novas oportunidades mostraram-se bastante escassas para o jovem e ele seguiu alternando entre a equipe profissional e as categorias inferiores (base ou equipe B) durante as duas temporadas seguintes (somou apenas 479 minutos na Bundesliga, espalhados por 24 jogos: uma média de aproximadamente 19 minutos por partida).

A temporada 24/25, no entanto, representa uma evolução no desenvolvimento do jogador: após recuperar-se de uma lesão que o afastou dos primeiros jogos, Bischof saiu do banco no confronto diante do Bayer Leverkusen na terceira rodada da Bundesliga e foi titular em todas as rodadas seguintes da competição. Também atuou seguidamente nos confrontos do clube alemão na UEFA Europa League, sendo poupado apenas quando ocorreu um jogo da Copa da Alemanha.

Posição

Ao longo da gestão do ex-treinador Pellegrino Matarazzo, o TSG Hoffenheim quase sempre atuou a partir de uma formação base com três zagueiros e um trio ofensivo. Nessa estrutura, Bischof acumulou a maioria de seus minutos como meio-campista, variando entre o setor direito e esquerdo do campo de acordo com cada partida. Vale lembrar que ele foi meia-atacante em grande parte de sua passagem pelo futebol de base.

Não é possível afirmar com certeza qual formação o novo treinador Christian Ilzer irá utilizar, mas durante sua passagem pelo Sturm Graz ele adotou preferencialmente um 4-4-2 losango e Bischof não deve ter problemas para se readaptar ao nosso esquema, seja como volante ou meia-atacante. Por conta dessa mudança, esta análise do jogador está mais centrada naquilo que é capaz de fazer do que em suas funções dentro da estrutura da equipe.

Formação base do TSG Hoffenheim sob o comando do ex-treinador Matarazzo

Movimentação, visão de jogo e execução de passes

A qualidade mais destacável de Tom Bischof é a capacidade de progredir e criar jogadas a partir de passes com seu pé esquerdo. Formado como um meia-atacante, Bischof assumiu um papel recuado na equipe profissional, passou a receber a bola de frente mais vezes e tem justificado essa pequena mudança em seu estilo de jogo com um bom rendimento. É algo que o permite estar mais envolvido com o jogo, participando desde a construção até o acabamento das jogadas.

Bischof executa com certa frequência um movimento saindo do centro para o corredor lateral, algo que o permite receber a bola fora do bloco de marcação adversário e com mais tempo para agir. Ao receber um passe, ele geralmente atrai pelo menos um jogador adversário e encontra companheiros com passes verticais, contribuindo diretamente com o desenvolvimento das jogadas. Esse é um padrão recorrente em jogadas de saída de bola do TSG Hoffenheim e também durante em fase ofensiva, próximo da grande área adversária.

Exemplo de movimentação lateral, com passe para progredir por dentro

Embora tenha atuado como um meio-campista pelos dois lados, a depender de quem é escalado junto a si, sua qualidade de passe tende a ser melhor explorada quando parte de posições mais à direita. O motivo para isso é o posicionamento de seu corpo ao receber passes por ali: Bischof quase sempre controla a bola usando seu pé esquerdo (dominante) e "abre" seu corpo para o centro do campo (girando de maneira que o tronco esteja voltado para lá).

A partir da direita, essa combinação de movimentos afasta a bola do seu marcador mais próximo, criando espaço suficiente para que consiga executar passes diagonais ou inversões sem necessitar de um reajuste no corpo — assumindo que ele receba a bola completamente de frente, o ângulo que se ofereceria para ele realizar o mesmo tipo de passe demandaria uma rotação adicional do quadril, desperdiçando segundos preciosos no futebol de alto nível. Tais passes em diagonais curtas, como no exemplo abaixo, são uma das marcas do jogo do alemão.

Exemplo de orientação corporal e passe a partir da direita

Ao atuar a partir da esquerda, o que acontece é que seu pé esquerdo está mais próximo do marcador que se aproxima, caso ele repita o mesmo movimento (abrindo o corpo para o centro). Ademais, além da limitação gerada pela linha lateral, passes diagonais de fora para dentro a partir da esquerda geralmente ocorrem com uma curvatura que aproxima a bola do marcador, caso o jogador seja canhoto. Esses fatores tornam naturalmente as jogadas mais arriscadas e são alguns dos motivos pelos quais ele tende a ser mais conservador em suas ações nessas situações, muitas vezes apenas circulando a posse de bola com passes para trás ou para o lado.

Exemplo de orientação corporal e passe a partir da esquerda

Ao receber diretamente pelo centro, um tipo de passe comum realizado por ele é a diagonal de dentro para fora, em lançamentos longos ou até mesmo passes rasteiros. Dessa maneira, Bischof é capaz de ativar companheiros nos dois corredores laterais com passes ao espaço, para que recebam em velocidade.

Exemplo de passe em diagonal de dentro para fora

A cereja do bolo no repertório de passes de Tom Bischof é a criação de chances a partir de passes em profundidade. Além do recurso técnico para completar passes de difícil execução, Bischof tem também a noção de espaço para identificar atacantes atacando a última linha defensiva e rapidamente acioná-los, seja na paralela ou em diagonal. A assistência registrada por ele na partida contra o VfL Bochum (quando bateu sete marcadores com um único passe) exemplifica perfeitamente sua capacidade de criar chances com esse tipo de jogada.

Assistência de Bischof contra o Vfl Bochum

Essa qualidade vai de encontro a outra de suas características: o jovem meia é um jogador de natureza bastante vertical e está sempre buscando maneiras para fazer com que sua equipe avance no terreno de jogo, mesmo que seja necessário assumir riscos para isso. Essa tendência a acelerar jogadas aparece principalmente em situações nas quais o TSG Hoffenheim recupera a posse de bola e inicia uma transição ofensiva. Bischof naturalmente desperdiça algumas posses por arriscar passes com frequência, mas pode-se argumentar que a quantidade de ataques vantajosos que ele cria dessa forma compensa o seu volume de perdas.

Exemplo de verticalidade pós recuperação de posse

Bola parada

O meio-campista do TSG Hoffenheim é também um bom criador a partir de jogadas de bola parada, seja em escanteios ou cobranças de faltas laterais, e tem uma média levemente superior a uma chance criada por partida disputada na atual edição da Bundesliga. Apesar de ser o jogador mais jovem do elenco, assumiu a responsabilidade pelas bolas paradas da equipe e mostrou-se capaz de gerar perigo em diferentes estilos de cobranças.

Bischof prepara-se para cobrar escanteio — Reprodução: DAZN

Finalizações

Devido a sua função atual na equipe, não surgiram tantas oportunidades para finalizar na atual temporada: até a décima rodada da Bundesliga, Bischof arriscou dez chutes (1.49 por 90 minutos disputados), acertando o alvo 30% das vezes. Ele geralmente busca chutes mais colocados a partir da região da entrada da área, que tem um grau de dificuldade elevado. Apesar de não ter marcado um gol ainda, seu histórico em categorias de base sempre foi positivo e não deve demorar muito mais para ele marcar o primeiro gol de sua carreira profissional (excluindo partidas pela Regionalliga).

Mapa de finalizações de Bischof em todas as partidas de Bundesliga que já fez

Ataque à área

Após participar da construção de jogadas, é possível observar Bischof realizando várias corridas de ataque à área no meio-espaço (intervalo entre lateral e zagueiro), principalmente quando a jogada se desenvolve no setor em que ele está presente — o meia pode receber após atacar ou romper esse espaço em condução. O timing de seus desmarques é bom e, ao receber, ele tende a realizar cruzamentos em direção ao meio da área. Dessa forma surgiu o primeiro gol do clube alemão contra o Lyon, em confronto válido pela UEFA Europa League. Caso o novo treinador opte por utilizar o meia em posições mais avançadas, seria uma capacidade a ser bem explorada.

Exemplo de ataque ao meio-espaço (com condução)

Comportamento defensivo: agressividade nos embates

Atuando em uma dupla de volantes, Bischof destaca-se por ser o mais agressivo dos jogadores de meio, constantemente saltando para pressionar e engajando em duelos diretos para tentar forçar erros ou retomar a bola diretamente. Ele é particularmente eficiente ao detectar controles ruins de jogadores adversários para avançar e desarmá-los...

Exemplo de pressão bem sucedida

porém deixa a desejar no timing de algumas de suas pressões. Além de ceder espaços em suas costas, permitindo giros ou passes rápidos, tem também dificuldade para recuperar tal espaço, uma vez que não se trata de um jogador muito veloz.

Exemplo de pressão mal sucedida

Essa inconsistência é algo natural considerando a formação do jogador, mas de maneira geral ele cumpre bem as obrigações que se espera de alguém atuando como volante e trabalha duro durante a fase defensiva. Assumindo que siga atuando nesta função, seria benéfico trabalhar para temporizar algumas jogadas ao invés de adotar postura agressiva com tanta frequência — certamente será algo debatido por seus próximos treinadores.

Futuro distante do TSG Hoffenheim?

A temporada atual representa um marco significativo na carreira de Tom Bischof: apesar de ter uma experiência relevante no futebol profissional para alguém tão jovem (19 anos), essa é a primeira vez em que ele participa de uma sequência de jogos, estabelecendo-se firmemente como um jogador titular. Seu desenvolvimento tem sido notável e não seria exagero dizer que hoje trata-se de um melhores jogadores jovens de toda a Bundesliga: prova disso é que tem sido monitorado por diversos outros clubes alemães, como o Eintracht Frankfurt. 

Tom Bischof é um jogador com enorme potencial criativo, uma característica que por si só conta muitos pontos. Soma-se a isso sua disponibilidade para trabalhar arduamente durante os momentos sem bola e o resultado é alguém que pode ser bastante impactante dentro de campo, mesmo tão jovem. É certo que o TSG Hoffenheim tentará chegar a um acordo para a renovação de seu contrato, mas restando pouco mais de seis meses para seu encerramento, será uma tarefa difícil. Aonde quer que esteja, provavelmente seguirá despertando o interesse de torcedores.

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