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Gigantes de um tempo: por onde andam os maiores campeões da DDR-Oberliga (parte 1)

Decacampeão da DDR-Oberliga, o Dynamo Berlim nasceu e venceu graças a íntima ligação com a Stasi, o braço armado da República Democrática Alemã.

Foto/Reprodução: Imago

Dominantes dentro da Alemanha Oriental, Dynamo Berlim, Dynamo Dresden, Vorwärts Berlim, Carl Zeiss Jena e FC Magdeburg não conseguiram repetir o feito no país unificado. Esmagados por um sistema econômico que não era o seu, os times da antiga República Democrática Alemã sofrem para alcançar a elite do futebol nacional, amargando tristes posições nas divisões inferiores do país.

Com o intuito de iluminar o passado glorioso e apresentar o presente de luta, esse texto, dividido em cinco partes, falará sobre cada um dos cinco maiores times da DDR-Oberliga. Dos títulos ao ostracismo, em alguns casos, os gigantes de uma era merecem que a sua história permaneça viva, até que tenham os holofotes para poderem, eles mesmos, contarem os seus feitos.

Foto/Reprodução: Thomas Lehmann

O maior, dentre todos esses clubes é, sem dúvida, o Dynamo Berlim, dez vezes campeão da DDR-Oberliga. Sediado na capital, o Dynamo Berlim era o mais bem sucedido dentre os Dynamos, clubes que pertenciam ao serviço de inteligência e segurança da Alemanha Oriental. Atualmente na Regionalliga Nordost, uma das cinco ligas que formam a quarta divisão alemã, o Die Weinroten, como é chamado, foi o primeiro a alcançar um feito que só seria repetido nesta temporada, 19/20, quando o FC Bayern venceu a Bundesliga pela oitava vez consecutiva, algo que o Dynamo já havia feito (na primeira divisão da Alemanha Oriental) entre 1978 e 1986, aumentando para dez nas duas temporadas seguintes.

Mas a sua grandiosidade não surgiu do nada. A equipe foi um projeto político e pessoal do, até então, chefe da Stasi Erich Mielke, que queria garantir que a capital da Alemanha Oriental, Berlim, tivesse um time forte, dominante e que representasse bem a sede do poder alemão.

Como chefe da Stasi, Mielke tinha controle sobre todos os Dynamos, incluindo o mais forte deles: o de Dresden. Para engrandecer o seu projeto, Mielke transferiu todos os atletas do Dynamo Dresden para o seu novo clube, o Dynamo Berlim.

Pensado como objeto de marketing e poderio do estado, o Dynamo Berlim contou com muitos benefícios políticos para alcançar a sua grandeza. Destinado ao sucesso e com grandes ambições, a equipe da capital deveria representar a força e a eficiência comunista em toda a Europa. Com as melhores instalações, os melhores treinamentos e os melhores jogadores – muitos craques eram delegados para o Dynamo Berlim, aumentando a qualidade do seu elenco – era de se imaginar que a equipe sonhada por Mielke se tornaria a grande potência da Alemanha Oriental.

Foto/Reprodução: Martin Hearn/ Flickr
Erich Mielke, ao centro.

Como todo grande clube, o Dynamo Berlim era extremamente odiado. Sob a tutela da polícia secreta, que perseguia, torturava e matava dissidentes, era compreensível que grande parte dos alemães sentissem repulsa pela equipe que dominava o país, esmagando as suas adversárias no campo e nos bastidores.

Ser o time da repressão significava muito para o Dynamo Berlim e para os outros clubes da Alemanha Oriental. “Garfados” pelo novo projeto da capital, os times do resto do país viam os seus melhores jogadores serem designados para o Berlim e os árbitros, bem, terem, no mínimo, atuações bem duvidosas.

Segundo matéria da CNN, um ex-árbitro chamado Bernd Heynemann disse, em uma conferência em 2015, que após uma derrota do Dynamo Berlim, todos os árbitros foram convocados e ouviram a seguinte frase: algo assim não deve acontecer.

E as vantagens não terminaram por aí. Na mesma matéria em que cita o ex-árbitro Heynemann, a CNN falou com Falko Götz, ex-jogador da equipe da Stasi. Na reportagem, Götz confirmou que, em pelo menos uma ocasião, lhe deram medicamentos que aumentavam o desempenho esportivo sem que lhe fosse avisado do que era.

Todas essas beneficies, e toda a pressão exercida pela polícia secreta da Alemanha Oriental só poderia resultar em vitórias. E elas vieram aos montes. Depois de um começo instável, o Dynamo Berlim engatou uma sequência impressionante de conquistas. Foram dez campeonatos nacionais seguidos! Algo inédito na DDR-Oberliga e nunca atingido na Bundesliga.

Foto/Reprodução: David Crossland
Estádio do Dynamo Berlim.

Imparáveis em território nacional, o Dynamo Berlim só encontrava dificuldades quando viajava para fora do país. Confrontos contra Liverpool, Roma, Saint-Étienne, entre outros, era comum para os alemães. Mas os anos de glória acabariam na década de 90, junto com a República Democrática Alemã.

Associado, desde o começo, com o poder, o Dynamo Berlim sofria represália de todos aqueles que eram contra a Stasi e ao modelo da Alemanha Oriental. Sem o apoio do governo e da Stasi e com o seu “fundador” preso, a antiga potência entrou em queda livre. Depois de muitos anos sofrendo nas ligas mais baixas do país, o clube entrou em solvência e foi resgatado pelos seus torcedores, que viram, em 2014, o clube retornar a quarta divisão alemã, local em que está até hoje.

Manchado pela repressão e pelas políticas de favorecimento, o Dynamo Berlim sofre nas divisões inferiores da Alemanha. Com uma torcida que se mantém fiel e orgulhosa do seu período vencedor, a equipe da capital está longe de figurar entre as principais forças do país, mas tem um currículo e uma história que é difícil de se apagar, por mais triste, antiética e corrupta que tenha sido a sua construção.

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